Saturday, January 13, 2007

Os modos de variabilidade da circulação atmosférica identificados a partir da análise do geopotencial

Os modos de variabilidade que a seguir se apresentam são, normalmente, identificados a partir da análise da altitude do geopotencial. Ao contrário do que aconteceu com a apresentação da NAO, os mapas ilustrativos destes modos serão feitos para todo o hemisfério Norte, uma vez que há situações em que temos múltiplos centros de acção cuja extensão ultrapassa o quadro da Bacia do Atlântico Norte. No entanto, só serão analisados os modos de variabilidade tipicamente da Bacia do Atlântico Norte, região onde se localizam os centros de acção mais importantes.
A cartografia dos padrões de teleconexão da circulação atmosférica foi baseada em mapas compósitos de pressão ao nível do mar e do geopotencial aos 500 hPa, elaborados a partir dos valores mais elevados (fase positiva) e mais baixos (fase negativa) dos índices de evolução temporal desses padrões disponíveis no Climate Prediction Centre (CPC), ou a partir das fórmulas de Wallace e Gutzler (1981). A metodologia utilizada por Wallace e Gutzler (1981) é distinta da utilizada por Barnston e Livezey (1987) e do CPC. Estas últimas são, de facto muito semelhantes e chegam a resultados praticamente iguais. As diferenças encontram-se, em alguns casos, somente na nomenclatura.
Assim, no primeiro caso (Wallace e Gutzler, 1981), os padrões de teleconexão são definidos por vários ensaios de mapas de correlações entre um ponto base e os restantes pontos do campo climatológico. Os padrões resultantes destas correlações representam como cada ponto está relacionado com os pontos vizinhos. No ponto base a correlação é máxima (1) e esta vai decrescendo à medida que aumenta a distância em relação ao ponto de referência. Em algumas ocasiões, formam-se núcleos secundários de correlação significativa, positiva ou negativa, indicando que há áreas que registam, respectivamente, variação em fase ou oposição de fase, com o núcleo que contém o ponto base. Um determinado padrão fica definido pela localização geográfica dos centros de correlação positiva e negativa, os quais podem distar uns dos outros de vários milhares de quilómetros. Outro aspecto importante nesta metodologia é a escolha do ponto base óptimo, o que revela de forma mais nítida todos os núcleos de correlação positiva e negativa. Tal ponto só é definido após um número óptimo de ensaios, testando vários pontos base. Depois de definidos todos os núcleos de determinado padrão, os autores apresentam fórmulas sobre as quais se podem calcular índices de evolução temporal. Estes índices são baseados na combinação linear dos valores de geopotencial em cada ponto central de cada núcleo que forma o padrão em causa. Desta feita, para os cinco padrões identificados por Wallace e Gutzler (1981), o cálculo das séries temporais de cada padrão é definido da seguinte forma:

Pacific North American (PNA) = ¼[ (55ºN,20ºW)-(45ºN,165ºW)+(55ºN,115ºW)-(30ºN,85ºW)]
Eastern Atlantic (EA) = ½(55ºN,20ºW) - ¼ (25ºN,25ºW) – ¼ (50ºN,40ºE)
Western Atlantic (WA) = ½ (55ºN,55ºW) – ½ (30ºN,55ºW)
Western Pacific (WP) = ½ (60ºN,155ºE) – ½ (30ºN,155ºE)
Eurasian Pattern (EU) = - ¼ (55ºN,20ºE) + ½ (55ºN,75ºE) – ¼ (40ºN,145ºE)


Estes índices podem ser posteriormente usados para gerar mapas compósitos, construídos a partir de um conjunto de situações definidas por um determinado valor, acima ou abaixo de um limite do índice escolhido previamente. Desta forma, podem fazer-se mapas compósitos das fases positivas (valores do índice acima de determinado valor) e das fases negativas (valores do índice abaixo de um determinado limite). O valor limite do índice a ser considerado para a elaboração dos mapas compósitos foi escolhido tendo em conta um compromisso entre um número considerado razoável de ocorrências (para que as médias sejam significativas) e o valor desse índice seja suficientemente elevado em valor absoluto para melhor caracterizar as fases positivas e negativas.
Por seu turno, a metodologia de Barnston e Livezey (1987) é baseada na ACP com rotação aplicada ao campo de geopotencial ao nível dos 700hPa, metodologia utilizada pelo Climate Prediction Centre (CPC). Assim, dez padrões foram identificados e correspondem a um igual número de vectores próprios, obtidos após rotação varimax. Os índices de evolução temporal são as componentes principais da ACP. Estes índices estão disponíveis no CPC, mas só é atribuído um valor nos meses em que um determinado padrão é considerado como principal, ou significativo. Para a apresentação no presente trabalho dos diferentes padrões, estes índices foram também utilizados para gerar mapas compósitos. Os padrões que vão ser apresentados não resultam, portanto, de uma ACP, mas sim de mapas compósitos, à semelhança do que foi feito para os padrões identificados por Wallace e Gutzler (1981).
Os trabalhos de Wallace e Gutzler (1981) e Barnston e Livezey (1987), apesar de distintos nas metodologias, são complementares. Os segundos apresentam um maior número de padrões. Nem sempre o mesmo padrão num e noutro trabalho tem rigorosamente a mesma configuração, como é o caso, por exemplo do Eastern Atlantic (EA). Outros padrões parecem “desdobrar-se” no trabalho de Barnston e Livezey (1987). É o caso do Eurasian Pattern (EU) identificado por Wallace e Gutzler (1981), que dá origem a dois padrões distintos, no de Barnston e Livezey (1987): o Eurasia 1 (designado por Scandinavia no CPC) e o Eurasia 2 (Designado por East Atlantic/Western Russia no CPC). Na presente dissertação, foram sobretudo, escolhidos os índices temporais resultantes da metodologia de Barnston e Livezey (1987), uma vez que se afigura mais completa. De Wallace e Gutzler foi utilizado somente o índice para o padrão West Atlantic (WA). Todos os outros, à excepção da NAO, resultam dos índices disponíveis no CPC. Na identificação da Oscilação do Atlântico Norte (NAO) foi utilizado o índice de Hurrel (1995), para a definição dos mapas compósitos das fases positivas e negativas. Só irão ser analisados os padrões que à partida, pela sua localização geográfica, terão maior influência na região em estudo, isto é, o Atlântico Norte e a Europa, onde se inclui a Península Ibérica.

Existe um número crescente de trabalhos que focam os padrões de teleconexão atmosférica. Quase todos se apoiam em Wallace e Gutzler (1981) ou em Barnston e Livezey (1987). Alguns resumem-se a meras sínteses e tratam-se, sobretudo de artigos metodológicos (Navarra, 1999; Storch e Zwiers, 1999). Outros, partem de resultados de Wallace e Gutzler (1981) para refazer, melhorar e complementar a análise, como é o caso de Horel (1981). Neste último caso, o autor aplica a rotação de factores às componentes principais identificadas por Wallace e Gutzler (1981), no sentido de refinar a análise, já que foi dito que uma rotação pode dar origem a estruturas mais simples de interpretação mais facilitada. Os padrões obtidos não diferem muito dos anteriormente identificados por Wallace e Gutzler (1981), apesar do uso da rotação de factores. Esbensen (1984), utilizando uma metodologia diferente, identificou padrões muito semelhantes aos anteriores e parece situar-se já a meio caminho dos resultados obtidos posteriormente por Barnston e Livezey (1987). Finalmente, o Climate Prediction Centre (CPC) apoia-se, ainda hoje na metodologia de Barnston e Livezey (1987), disponibilizando na página de internet os resultados da análise, com mapas das fases positivas e com os índices temporais de todos os padrões desde Janeiro de 1950 até ao presente ( http://www.cpc.noaa.gov ).
Segue um estudo dos modos de variabilidade da circulação atmosférica na Bacia do Atlântico Norte e regiões circunvizinhas. São focados exclusivamente os principais modos.

1. “Eastern Atlantic Pattern” (EA)

O padrão EA (figura 1, 2 e 3) é, por vezes confundido com a NAO, pelo facto de ser estruturalmente semelhante, isto é, apresenta-se, também, com uma estrutura dipolar mas com os centros mais deslocados para sudeste, em direcção à Europa e em direcção à parte subtropical do Atlântico Norte. Barnston e Lyvezey (1987) definem-no como tendo um centro situado aproximadamente a 55ºN e 20º-35ºW e, outro mais a sul, situado a 25º-35ºN e 0º-10ºW. Como se pode observar na figura 3.3 o centro mais meridional está já situado em zonas mais subtropicais, facto que também permite distinguir este padrão da NAO. Segundo o CPC, este padrão ocorre em todos os meses excepto entre Maio e Agosto.
Fig. 1 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da fase positiva do modo EA
Fig. 2 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da fase negativa do modo EA

Fig. 3 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da diferença entre a fase positiva e a fase negativa do modo EA


2. “Eastern Atlantic Jet Pattern” (EA-Jet)

O EA-Jet (figura 4, 5 e 6) tem uma estrutura espacial semelhante ao EA e ocorre nos meses em que este não ocorre, ou seja, é um padrão que, de acordo com o CPC, aparece somente entre Abril e Agosto. É, da mesma forma, um padrão de estrutura dipolar, contudo os núcleos de anomalias de geopotencial não são tão circulares como no caso do padrão EA, mas mais alongados no sentido Oeste-Este. O núcleo mais a sul está localizado no Norte de África e Mediterrânico. A série temporal denota perfeitamente um domínio da fase positiva deste padrão na última metade do século. Essa fase positiva traduz-se num aumento de intensidade da corrente de Oeste nas latitudes médias da Europa e do Atlântico Norte oriental. Já a fase negativa sugere situações de bloqueio, traduzidas na presença de situações anticiclónicas sobre as Ilhas Britânicas e depressões localizadas na Europa meridional.


Fig. 4 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da fase positiva do modo EA-jet


Fig. 5 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da fase negativa do modo EA-jet

Fig. 6 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da diferença entre a fase positiva e a fase negativa do modo EA-jet



3. Eurasia 1 / Scandinavia

O padrão Eurasia 1, também conhecido por “Scandinavia” (figura 7, 8 e 9), tem o seu centro principal localizado sobre a Escandinávia e que se estende pelas regiões do Oceano Árctico e Norte da Rússia (Sibéria). Dois centros secundários de sinal contrário localizam-se em cada lado deste núcleo principal. O núcleo ocidental estende-se desde a Gronelândia até ao Norte Península Ibérica e, o núcleo oriental alonga-se por quase toda a região Norte da Rússia. Ocorre em quase todos os meses, excepto nos meses de Junho e Julho. A fase positiva está associada a situações de bloqueio anticiclónico na região da Escandinávia e Rússia, enquanto que na fase negativa há registo de anomalias negativas de pressão nesta região. Na região da Europa ocidental e Norte da Península Ibérica, a fase positiva está associada à chuva, com a formação de um vale em altitude. A situação é inversa na fase negativa, com a formação de uma crista anticiclónica em altitude sobre a Península Ibérica e a Europa Ocidental. Em cada uma das fases, as massas de ar que atingem a Península Ibérica são sempre massas de ar frio, mas com trajecto oceânico na fase positiva, e com trajecto mais continental na fase negativa.


Fig. 7 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da fase positiva do modo Scand.


Fig. 8 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da fase negativa do modo Scand.



Fig. 9 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da diferença entre a fase positiva e a fase negativa do modo Scand.


4. Eurasia 2 (EU2)

Este padrão é também conhecido por “East Atlantic/Western Russia” (figura 10, 11 e 12) e ocorre ao longo de todo ano excepto nos meses de Verão (Junho a Agosto). É constituído por dois centros principais de sinal contrário, um situado na Europa ocidental (com o núcleo entre o Reino Unido e a Escandinávia) e, o outro, localizado mais a oriente, com o núcleo situado a Norte do Mar Cáspio. Um terceiro núcleo (de muito menor expressão e do mesmo sinal do núcleo do Mar Cáspio) surge no Atlântico e, segundo o CPC, localiza-se na Primavera junto à costa Portuguesa, enquanto que no Outono se desloca mais para a região da Terra Nova. Na figura 3.6 este facto não é visível, pois a análise é feita mês a mês e este centro aparece mais ligado à região da Terra Nova. A fase positiva traduz-se por situações anticiclónicas na Europa ocidental e Península Ibérica, acontecendo exactamente o oposto na Europa oriental. Em altitude forma-se uma crista anticiclónica bem evidente na figura 3.6, enquanto que na fase negativa surge o oposto com anomalias negativas sobre a Europa ocidental, correspondente à formação de um vale em altitude.



Fig. 10 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da fase positiva do modo EA/WR




Fig. 11 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da fase negativa do modo EA/WR



Fig. 12 - Mapa compósito das anomalias do campo do Geoptencial aos 500hPa à escala intermensal da diferença entre a fase positiva e a fase negativa do modo EA/WR

5. Outros Modos de variabilidade

Como foi já referenciado, os padrões da circulação atmosférica do Hemisfério Norte não se resumem aos já apresentados. Há ainda outros por analisar, mas de menor interesse explicativo para a variabilidade da precipitação na Península Ibérica. Estão neste caso os modos Pacific North American (Wallace e Gutzler, 1981; Barnston e Lyvezey (1987), o Polar Eurasia, o West Atlantic, o West Pacific Oscillaton (Barnston e Lyvezey, 1987), Tropical/Northern Hemisphere Pattern (Barnston e Livezey, 1987), o Northern Asian Pattern (Barnston e Livezey, 1987), o East Pacific (Barnston e Livezey, 1987), para citar os mais importantes. Por não terem implicações climáticas na região em estudo, ou estas serem muito reduzidas, fica somente a sua indicação e para mais pormenores sobre estes padrões (e os outros)


Referências

Barnston, A. G.; Livezey, R.E. (1987) – Classification, Seasonality and Persistence of Low-Frequency Atmpspheric Circulation Patterns.Monthly Weather Review, 115: 1083-1126.

Esbensen, S.K. (1984) – A Comparison of Intermonthly and Interannual teleconnections in the 700 mb Geopotential Height Field during the Northern Hemisphere Winter. Monthly Weather Review. . 112: 2016-2032.

Wallace, J.M.; Gutzler, D.S. (1981) – Teleconnections in the Geopotential Height Field during the Northern Hemisphere Winter.Monthly Weather Review, 109: 784-812

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